terça-feira, 30 de dezembro de 2008

"2008 em filmes"


Fazer um balanço geral e eleger os melhores filmes do ano é mais difícil que falar da cena musical, já que o acesso a filmes novos é bem mais restrito e o próprio ato de ver e pensar cinema requer bem mais do que se imagina. Então, revendo a lista de filmes vistos este ano, percebi que a maioria das obras que me marcaram de alguma maneira é de 2007, e se fosse reduzir a lista a dez nomes, só restariam 2 de 2008: Blindness e The Happening. O primeiro, mesmo com sua sociologia um tanto defasada, problemas graves como a trilha sonora e os trechos de uma narração tão completamente inútil que quase saiu de cena, ainda assim é motivo de orgulho num ano em que diretores brasileiros nos deram produções vergonhosas como Linha de Passe e Feliz Natal; enquanto no ano passado tivemos Falsa Loura (!), Jogo de Cena (!) e Cleopátra, esses sim, inesquecíveis obras que só pude ver em 2008 e obrigatoriamente integram a lista. The Happening, para o desgosto dos críticos, trouxe Shyamalan ainda nadando contra a corrente do cinema americano, no seu filme mais inacreditável e que, de minha parte, até mereceu revisão. Um "objeto não-identificado" no meio de tanta apatia.
Os Coen e Woody Allen, que estiveram presentes tanto em 2007 quanto em 2008, foram melhores ano passado. No Country for Old Men melhora a cada revisão e, opostamente à naturalidade de Burn After Reading, me parece uma obra mais pensada e mais exigente. Cassandra's Dream também é o oposto de Vicky Cristina Barcelona, o primeiro sendo um dos filmes mais sombrios de Allen, que choca pela simplicidade, e o outro sendo um de seus filmes mais deliciosamente leves. Dói um pouco deixar o mais recente fora da lista, já que ambos são pontos altos do Allen pós-2000.
Meus queridos Julio Medem, Wes Anderson e Fatih Akin também entram para a lista com suas produções de 2007. Caótica Ana é de uma abertura espantosa, fruto de alguém que pensa cinema de uma maneira bastante livre de qualquer tipo de conceito concreto; The Darjeeling Limited foi um dos momentos mais inspirados e sensíveis da carreira de Anderson, trazendo tudo que os seguidores dele adoram e os detratores odeiam; e Auf der anderen Seite (no Brasil, Do Outro Lado) me proporcionou emoções verdadeiras, algo que geralmente filmes com dramas socio-políticos aliados a familiares tentam fazer sem sucesso.

"Retrospectiva musical de 2008, última parte"


As músicas que integram o post de hoje poderiam ter sido incluídas em outros, mas foram selecionadas especialmente para a ocasião do fim de ano. Esta pocilga ficará inativa durante os primeiros dias de 2009 e então voltará tratando de qualquer coisa que seja relevante.

A parte final de uma lista de melhores novidades do ano é uma ótima oportunidade para apresentar esta música. In Ear Park é um disco que transpira nostalgia e Classical Records é um verdadeiro tesouro nesse tema. Se deparar com uma música tão simples e tão boa entre os arranjos tão bem elaborados do Department of Eagles é pura satisfação.

Do you listen to your classical records any more?
Or do you let them sleep in their sleeves, where they be?
Do you suffer through those records that you turned around?
Or do you make them sleep in their sleeves where they weep?



Depois da festa que fizeram em 2006, lançando dois discos ótimos e sendo um deles uma regravação completa de Pussy Cats - álbum lançado por Harry Nilsson em 74 e produzido por John Lennon - o melhor que os Walkmen poderiam fazer era You & Me, o trabalho mais calmo e melancólico da banda até agora.

I know that it's true
It's gonna be a good year
Out of the darkness
And into the fire
I tell you I love you
And my heart's in the strangest place
That's how it started
And that's how it ends



FELIZ 2009!

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

"Amigos íntimos" ou "Retrospectiva musical de 2008, décima parte"


Quase finalizando nossa retrospectiva, hoje falarei dos bons discos lançados por artistas que eu já vinha acompanhando há algum tempo, que já me marcaram em outros tempos e continuam merecendo meu tempo e respeito.

Gosto muito de praticamente tudo que Cat Power lançou em seus mais de 10 anos de carreira, mas quando conheci seu trabalho ela já havia lançado 6 discos. O intervalo de três anos entre You Are Free (2003) e The Greatest (2006) me deu tempo para me aprofundar e ouvir tudo que eu tinha perdido até aquele momento, e ainda hoje considero algumas coisas inacreditáveis. Antes de Jukebox, só tinha acompanhado o lançamento de The Greatest, e este foi um dos grandes momentos (e é um dos grandes discos) da minha vida. Tendo perdido suas apresentações no Brasil em 2007, eu tinha muita emoção reprimida para o lançamento de Jukebox, e elas foram devidamente liberadas a cada audição. Hoje, deixando um pouco de lado o lado emocional, já consigo perceber que este não é um dos melhores álbuns de sua obra, mas ainda assim o considero tão bom quanto The Covers Record e algumas das novas reinterpretações estão isoladamente entre os melhores momentos de sua carreira.



Para aproveitar o que o Clinic proporciona você precisa gostar do universo musical que se repete em cada disco da banda. Não diria que é uma fórmula, e sim uma identidade, um modo de se diferenciar usando um tipo de disfarce sonoro. Ouvindo qualquer um de seus cinco discos, você encontrará a mesma banda, às vezes mais inspirada, mais coesa ou mais barulhenta. Em Do It!, de 2008, encontramos o momento mais focado e regular deles.



Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space foi um dos discos que mais ouvi na minha vida, e finalmente o Spiritualized lançou algo que mesmo sendo esteticamente distante do outro de 1997, é tão bonito e tão perigoso de se ouvir com frequência quanto ele.



O primeiro álbum do Beck depois da virada do milênio foi seu trabalho mais diferente de todos os outros que vieram antes, e ainda hoje Sea Change (2002) permanece como uma peça que não encaixa no resto de sua discografia e o ponto mais alto que ele alcançou. Modern Guilt, sua produção mais recente, é um disco que se assemelha àquele em alguns pontos, como o tom mais confessional das composições, mas é bem mais discreto na produção (que ficou a cargo do Danger Mouse) e até na duração, o que resulta num trabalho mais lapidado e direto.



Nick Cave não é exatamente alguém cuja carreira eu tenha acompanhado, mas um pouco antes do lançamento de Dig!!! Lazarus Dig!!! eu estava coincidentemente fazendo um apanhado geral da obra dele junto aos Bad Seeds, o que me permite encaixá-lo no "tema" de hoje. Na verdade, não há muito o que dizer. Aqui temos um dos melhores álbuns da banda, com momentos de climas variados, a poesia carregada (seja de humor negro ou de dor) de Cave sendo sempre o destaque.

sábado, 27 de dezembro de 2008

"Novidades" ou "Retrospectiva musical de 2008, nona parte"


Hoje é dia de reunir artistas que conheci em 2008, sejam eles estreantes ou mesmo os que já estão na ativa há muito tempo e só foram chamar minha atenção agora.

Santogold, estréia da colaboração entre a cantora Santi White e seu colega John Hill, foi uma das novidades mais gratificantes do ano. Todo feito em apenas 3 semanas, o disco emplacou um dos hits de 2008 (L.E.S. Artistes) e mostrou o quanto a dupla era versátil. Os arranjos de Hill passeiam por vários estilos, do dub ao punk, enquanto a voz e as letras de White os acompanham (se é que essa palavra é apropriada, já que o maior destaque está nela) com uma competência admirável.



Os produtores Joel Martin e Matt Edwards trabalham numa sonoridade baseada em samples obscuros de gêneros como exotica, disco, rock progressivo e trilhas sonoras desde 2004, mas só em 2008 foi lançado um LP no qual a dupla adotou o nome Quiet Village. O resultado disso tudo, Silent Movie, tomou forma de chill out e ambient, um disco muito bem elaborado e elegante, apesar das origens duvidosas.



Já fazem mais de dez anos que Erykah Badu lançou Baduizm, seu disco de estréia, mas só agora fui descobrir suas qualidades, com New Amerykah, Pt. 1: 4th World War. Espero que este realmente seja apenas a primeira parte de uma série de discos do mesmo nível.



Quando li o nome Gang Gang Dance pela primeira vez, pensei serem alguma banda de indie-rock pra pista, mas a capa de Saint Dymphna me conquistou e acabei dando uma chance. De fato, é um dos discos mais chocantes de 2008, que combina rock experimental com world, eletrônica e dub. Não é o primeiro disco deles, mas é tão completo que ainda não consegui me interessar em ouvir os anteriores.



O duo Fuck Buttons subverteu o gênero pós-rock (que tinha se transformado numa fórmula ultrapassada) e adicionou muito barulho, fazendo de Street Horrrsing uma estréia que impressiona desde os momentos iniciais.



É curioso o fato de eu só ter ouvido The Kills recentemente, já que pelo menos nas proporções do indie rock eles são bastante conhecidos. Mas depois de ver o vídeo de U.R.A. Fever em alguma madrugada insone, foi impossível não se render. Midnight Boom é um disco simples, mas de consequências interiores estrondosas.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

"Massageando a tristeza" ou "Retrospectiva musical de 2008, oitava parte"


Algumas pessoas também consideram o fim de ano uma época melancólica, e hoje temos uma seleção nesse clima, dedicada a todos que compartilham esse pensamento.

Durante muito tempo eu não consegui explicar Mountain Battles, um disco que me pegou de surpresa e que ouvi demais durante o ano. Até que certo dia li a resenha que Heather Phares fez para o allmusic e as palavras unfinished e open-ended definiram exatamente o que eu sentia a cada audição daqueles curtos 36 minutos. Continuar nadando contra a corrente depois de 18 anos do lançamento de Pod e, principalmente, manter uma sonoridade que não se mostra ultrapassada depois de tanto tempo deve ser uma coisa natural para as irmãs Deal. Deve ser algo relacionado ao fato de só terem lançado 4 discos (como The Breeders) nessas quase duas décadas. Além do lançamento do quarto álbum, este ano fizeram uma turnê mundial com direito a apresentação inesquecível no Brasil e foram selecionadas para a curadoria da primeira semana do festival All Tomorrow's Parties em 2009. Isso mostra que vivem um grande momento na carreira e que talvez não esperemos tanto para ouvir material novo mais uma vez. A música escolhida para integrar a seleção é das mais bonitas e doloridas que elas já fizeram, e claro, das melhores do ano.



Pouca gente ainda atura artistas que se apóiam na sonoridade oitentista, e espero que com o tempo eu ouça cada vez menos música que fica no saudosismo e não olha pra frente. Este não é o caso de Anthony Gonzalez, a metade que sobrou do M83, que em Saturdays=Youth combinou sua estética quase progressiva de música eletrônica independente com o pop daquela época. Impossível ficar apático ao ouvir os primeiros segundos de You, Appearing, música que abre o disco. E logo depois do alívio pop de Kim & Jessie, Skin of the Night resume a sonoridade que o caracteriza, com vocais pungentes e bateria eletrônica que parece não se encontrar em um padrão.



Victoria Legrand é dona de uma das mais belas vozes que já ouvi, e é impossível imaginá-la cantando em outras paisagens musicais que não as contruídas por ela e Alex Scally no Beach House, em sua maioria noturnas, melancólicas, apaixonadas. Devotion, segundo álbum da dupla, até começa aparentemente ensolarado, mas a segunda faixa logo informa que o tom é outro, e em Gila percebe-se que há momentos apropriados para ouvi-lo, e eles são as madrugadas frias.



Outra banda que está quase completando 20 anos de estrada e continua fazendo nossa alegria é o Magnetic Fields. Estes são mais generosos que as irmãs Deal e já lançaram até um irretocável disco triplo no final da década passada. Este ano, afogaram suas tristezas e algumas poucas alegrias em fuzz e dialogaram com outros irmãos, os Reid, do Jesus and Mary Chain. Contaram com a participação de Shirley Simms, que também colaborou em 69 Love Songs e agora nos deu uma bela música de fossa.



Além do choque das primeiras palavras de Third serem em portugês, também me impressionou o fato do Portishead ter se reinventado em 2008. Ainda hoje não entendo muito bem o fenômeno que parecem ter sido os dois primeiros discos deles (talvez por não ter vivido o momento e ter descoberto alguns anos depois), já que pra mim são sinônimos de repetição, principalmente por terem sido lançados com um intervalo de três anos entre eles. Prefiro fazer uma compilação com a melhor metade de cada um e guardar do lado de PNYC, assim me livro um pouco da impressão de que eles se levaram a sério demais. Em 2004, Beth Gibbons lançou, em parceria com Paul Webb (do Talk Talk), Out of Season, um disco que ainda hoje pode ser considerado a melhor coisa que ela já produziu. Em Third, que além do nome muito ruim, também tem uma das piores capas do ano, ouve-se muitos ecos daquele trabalho, do trabalho do Portishead e também algo que não é uma coisa nem outra, um sinal de que eles podem libertar-se de vez do espírito datado do trip-hop e nos apresentar a novos horizontes.
P.S.: Só fui perceber que The Rip era uma das melhores músicas que o Radiohead não fez depois daquele famoso vídeo em que Thom Yorke e Jonny Greenwood tocam-na sentados no sofá.



Bradford Cox foi uma das figuras mais presentes do ano. Primeiro foi o ótimo disco de estréia de seu projeto solo, Atlas Sound. Depois, metade do disco duplo que o Deerhunter lançaria no segundo semestre caiu na internet, junto com as versões demo de Logos, disco do projeto solo que até agora não viu a luz do dia. Na verdade, tudo aconteceu por causa de uma configuração do MediaFire que deu acesso aos arquivos do próprio Cox. Todos ficaram surpresos e caíram de amores instantaneamente pela nova e mais limpa sonoridade da banda. Mas Cox, que sempre teve a boa vontade de "blogar" sobre tudo que a banda fazia e no que estavam envolvidos, bem como disponibilizar para download versões demo/alternativas/remixes de músicas deles (na maioria das vezes com artwork e tudo), ficou P da vida e fez comentários precipitados de que não iria mais finalizar nada do que tinham "roubado" dele, e que aquelas versões demo seriam tudo que todos ouviriam. Depois voltou atrás, também via blog, e pediu que quem já tivesse baixado e pudesse comprar o disco o fizesse, para ajudar os selos Kranky e 4AD e a banda. Já quase no final do ano, também publicou um comentário sobre o e-mail falso em que um dos membros do Animal Collective PEDIA que, tendo duas músicas de Merriweather Post Pavillion vazado, disponibilizassem todo o álbum logo, pois este teria sido pensado para ser ouvido por inteiro. O último parágrafo do comentário sugeria aos fãs que gravassem seus próprios Merriweather, do jeito que imaginavam/queriam que ele fosse, para se distraírem enquanto esperavam o lançamento oficial. Talvez Cox não precisasse se expor tanto, já que o Deerhunter é uma das melhores bandas independentes da atualidade, e que os discos lançados este ano tanto pela banda quanto por ele como Atlas Sound são sensacionais. Finalizo o post com uma tristeza mais amena: Agoraphobia é uma das faixas mais encantadoras do ano. Considere isto um anti-clímax, pois ela não é cantada por Cox, e sim pelo guitarrista Lockett Pundt.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

"Feliz Natal" ou "Retrospectiva musical de 2008, sétima parte"


Um simples e pequeno post dedicado às festividades natalinas. Duas musiquinhas para dar vontade de abraçar parentes e amigos, praticar a solidariedade e tudo que ensinaram pra gente que se faz no Natal. Mas claro, retiradas de lançamentos decentes.

Talvez o Animal Collective esteja ficando cada vez menos experimental e mais melódico (consegue-se até identificar as letras das músicas!), mas é impressionante como a capacidade de fazerem ótimas melodias não se esgota. A faixa título do EP Water Curses poderia ter sido facilmente incluída em Strawberry Jam, mas que bom não ter sido, assim tivemos algo em 2008 para amenizar a espera por Merriweather Post Pavillion. As outras 3 músicas que a acompanham também estão entre as melhores composições do grupo, prova definitiva de que a fonte não seca.



O que esperar de uma colaboração entre Brian Eno e David Byrne? Em 2008, reinvenção. Duas das personalidades musicais mais inovadoras do século passado se juntaram novamente e dessa vez produziram um disco que transpira... gospel! O resultado é surpreendentemente belo.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

"2006" ou "Retrospectiva musical de 2008, sexta parte"


Olhando a lista de músicas que separei para ilustrar os textos dessa série que já está na parte seis, percebi que alguns artistas que eu conheci em 2006 - devido a ótimos lançamentos naquele ano - voltaram com discos que também merecem destaque. [Você também pode considerar esse post como resultado da dificuldade de reunir algumas músicas em grupos]

A principal diferença entre Feed the Animals (2008) e Night Ripper (2006) é que o mais recente é instantâneo. Lembro que demorou um pouco pra que eu aproveitasse o anterior como ele deveria ser aproveitado, enquanto o primeiro impulso que me deu ao ouvir o disco que Girl Talk lançou esse ano no esquema "pague o quanto você quiser" foi de fazer uma festa. Além da diversão que a música proporcionaria, ainda imaginei como seria legal juntar os amigos pra tentar identificar todos os 322 samples através dos quais ele fora construído!



Com o Ratatat aconteceu o contrário. Classics (2006) é mais coeso e homogêneo que LP3 [nome melhor que este, só Third], sendo consequentemente mais fácil de digerir por inteiro. LP3 traz um som mais leve e bastante fragmentado, no qual as guitarras nem sempre estão em primeiro plano. Os vídeos que acompanharam os três singles do disco são exemplo dessa fragmentação, tomando forma de vídeo-arte de interventiva.



O TV on the Radio, um dos maiores destaques de 2006, trouxe um disco digno de (quase) fim da primeira década do milênio. Com a produção e execução impecáveis de sempre, o destaque aqui é para a sonoridade carregada de emoção e positividade. Uma bela sugestão para ouvir nos últimos momentos do ano.



Six Demon Bag foi meu disco preferido de 2006 (depois de The Eraser, claro), e uma boa oportunidade de conhecer o trabalho do Man Man, já que nem The Man in a Blue Turban With a Face (2004), nem Rabbit Habits (2008) o superam. O último é seu trabalho mais acessível, e apesar de ter uma sonoridade mais lapidada e redonda, não oferece momentos de diversão à altura de músicas como Engrish Bwudd e Push the Eagle's Stomach.



De 2006 pra cá, o punk blues do quinteto australiano The Drones não sofreu muitas mudanças. Gareth Liddiard é dos melhores vocalistas/letristas de rock da atualidade, e fez I Don't Ever Want To Change ser uma das melhores faixas de dois anos atrás, façanha repetida atualmente com The Minotaur.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

"Segunda-feira experimental" ou "Retrospectiva musical de 2008, quinta parte"


Comecemos a semana esquentando o cérebro.

Conheci Matmos quando Björk ainda não conhecia Timbaland. A colaboração do duo foi um dos pontos essenciais para fazer de Vespertine o melhor álbum da islandesa, e sua participação na turnê do disco deu um novo brilho às canções mais antigas da cantora - aquele seria um ótimo momento pra ela dar um pulo aqui no Brasil. No mesmo ano da feliz colaboração, o Matmos também se encontrava num dos pontos altos de sua carreira, tendo lançado A Chance to Cut Is a Chance to Cure, um disco construído através de sons gravados durante cirurgias plásticas e manipulados posteriormente, transformando-se em música acessível na sua estréia na Matador Records. Durante toda a sua carreira, a tarefa foi basicamente a mesma: criar um tipo de regra e trabalhar em cima dela, seja gravando e manipulando sons de um rato em uma gaiola, seja criando uma galeria de "heróis" homossexuais, entre eles Ludwig Wittgenstein, Larry Levan, Joe Meek, Patricia Highsmith ou mesmo o Rei Ludwig II da Bavária. A regra criada para Supreme Balloon foi a não-utilização de sons gravados; se é que pode-se chamar isso de regra, já que mesmo no press release eles definem o álbum como "a simples degustação da cozinha sintética tradicional servida numa atmosfera informal". Aqui só foram usados sintetizadores, de todos os tipos e épocas, o que faz o ouvinte lembrar de nomes como Jean-Jacques Perrey e Wendy Carlos. Exciter Lamp and the Variable Band é dedicada a Norman McLaren, artista de animação abstrata, e possui um solo de Coupigny, um sintetizador modular construído na década de sessenta e utilizado por alguns dos grandes nomes da música concreta.



O ano também foi marcado por mudanças sutis no trabalho de Kieran Hebden, que guardou sua sonoridade mais orgânica para a quarta colaboração com o baterista Steve Reid, e, sob o nome Four Tet, lançou um EP mais eletrônico. Em NYC, o produtor e o lendário músico (que já tocou com Fela Kuti e James Brown, entre muitos outros) constroem um retrato musical da "Big Apple", não buscando referências em determinadas cenas ou músicos da cidade, e sim criando uma identidade nova inspirada nos lugares que dão nome às faixas do disco, feitas na base da improvisação e experimentação. Nada mais apropriado para retratar qualquer que fosse a cidade; sendo "a cidade que nunca dorme", além de apropriado é essencial. Em Ringer, Kieran Hebden (agora como Four Tet) chega a flertar com o kraut-rock, mas as batidas 4X4 que ouvimos em praticamente todo o EP (tirando 40 segundos de uma bateria catártica perto do final de Ringer e alguns momentos de percussão aparentemente orgânica de Wing Body Wing - faixa que mais remete ao Four Tet do início da década) passam a sensação de que Hebden talvez surpreenda num futuro próximo.





Provavelmente muitas obras de arte foram inspiradas por sonhos, e em algum momento de 2007, Tom Jenkinson (também conhecido como Squarepusher) teve um sonho no qual presenciava uma banda de rock com um baterista esquimó fazer uma apresentação "diferente", com um rio emergindo no palco e, ao invés de eletrocutar os membros da banda, causando fenômenos que mudavam sua sonoridade. Após acordar e se situar, ele sentiu que deveria compartilhar a experiência e começou a trabalhar no que em breve se tornaria o LP Just a Souvenir. É um disco que tem a sonoridade única do produtor e baixista que já foi comparado a Miles Davis, mesmo que ele tente soar como uma banda de rock quase eletrocutada. Não poderia resultar em algo ruim, e sim em algo muito doente. Confesso acreditar que Delta-V se refere à parte do sonho na qual o baixo mais parece "uma viga de aço tocada por uma motosserra, fechada num armário de mogno".



Sool, álbum mais recente de Ellen Allien, confesso não saber de onde veio. De uma mente fria e atenciosa a detalhes ou de veias pulsantes. Parece haver algo extremamente belo e humano por trás do minimalismo e da sutileza dessa nova realização da "berlinette", que instiga, perturba e encanta quase simultaneamente, mas necessariamente nesta ordem.



Um quê de perturbador também tem Quaristice, apesar disso não ser novidade para o Autechre. Uma das minhas alegrias particulares em 2008, seja ouvindo em salas de espera de consultórios médicos (nada mais apropriado) ou em bem-vindos headphones, perturba por seus 73 minutos divididos em faixas de diferentes durações, diferindo das longas texturas sonoras desenvolvidas por eles em toda a sua obra, criando incoesão e deixando a sensação de incompletude. Certamente não serve como introdução à preciosa obra dos produtores, mas está entre seus melhores.



Este foi o ano em que o dubstep saiu de Londres e ganhou o mundo, e também o ano em que o gênero se desenvolveu através de interações com outros gêneros de música eletrônica. Como é um gênero relativamente novo, inclusive para mim, me reservo o direito de comentar unificadamente sobre dois lançamentos que me marcaram bastante: Diary of an Afro Warrior, do inglês Benga, e Aerial, do holandês 2562. O primeiro era um dos discos mais esperados do ano, e é denso durante todos os seus quase 64 minutos. O segundo nos dá uma idéia do que pode acontecer se o dubstep infectar de vez outras vertentes, tamanho o flerte com o minimal techno.



quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

"Barulho" ou "Retrospectiva musical de 2008, quarta parte"


Adoro uma barulheira competente. Bem feita mesmo, e não causada pela adolescência tardia ou pelos problemas sexuais e familiares de um qualquer. Continuando com as pequenas amostras dos melhores lançamentos deste ano, ofereço alguns minutos deliciosamente barulhentos.

Aprendi que um duo podia fazer muita bagunça quando ouvi pela primeira vez White Blood Cells, ainda hoje meu disco preferido dos White Stripes. O No Age, dupla californiana que lançou o segundo álbum esse ano, não tem nada do blues-rock de Meg e Jack White, e sim um noise pop que pega de primeira devido às melodias, que mesmo afogadas na camada de distorção, são brilhantes.



Agora subtraia um integrante e adicione muita energia e garage punk. Matador Singles '08 é na verdade uma compilação de músicas lançadas por Jay Reatard no formato single durante o primeiro semestre, e essa concepção inversa só demonstra o quão poderosas são cada uma das canções.



O Blood on the Wall faz indie rock de primeira e em alguns momentos de Liferz ficam claros os ecos de Pixies, Smashing Pumpkins e Pavement, principalmente nas músicas cantadas por Brad Shanks.



Ainda na linha indie, temos uma banda de nome "shakespeareano" e um álbum cujo nome faz referência a um episódio de Seinfeld. A letra da música homônima à banda é a melhor do ano. Sério.



E certamente o segundo lugar fica com a letra de No, das Vivian Girls. No no no no no no no... brincadeira.



Já o Crystal Antlers faz um som bem diferente dos outros citados acima, seu EP é experimental e mesmo assim bastante sólido. Recomendo aos meus amigos que (ainda) gostam do Mars Volta. ;)



Por último, uma homenagem aos velhos tempos que não voltam mais citados no início do post. Broken Boy Soldiers ocupa um lugar especial na minha memória, mas Consolers of the Lonely não decepcionou.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

"Tradicionais" ou "Retrospectiva musical de 2008, terceira parte"


De onde o Fleet Foxes surgiu? Essa foi a pergunta que muitos se fizeram no início desse ano. Hoje já se sabe que eles estão na estrada desde 2006 e chamaram a atenção de um produtor (o mesmo que trabalhou com os Shins) com alguns shows, mas quando o EP Sun Giant foi lançado em abril, deu a impressão que poderia ser algum relançamento de uma banda esquecida injustamente em algum lugar da história. Depois de ouvir as cinco músicas já seria impossível pensar assim, pois elas carregam tantas memórias (imagéticas, sonoras, sentimentais), como um vórtice no inconsciente coletivo musical, que só poderiam ter sido feitas agora. Mykonos, em dois atos e menos de cinco minutos, pode mostrar isso muito bem.



Logo em junho foi lançado o primeiro LP deles, e a principal diferença entre este e o EP de menos de dois meses atrás é que, acredite, é ainda mais emocionante. White Winter Hymnal, o que falar da satisfação que cada elemento dessa pequena música proporciona?



No empate em que eu colocaria Fleet Foxes e mais uns 3 como melhor disco do ano, também estaria outro bastante tradicional, a tradição sendo, no caso, a música country americana. Ainda dói um pouco pensar que perdi as apresentações que Bonnie "Prince" Billy fez no Brasil, primeiro porque é um artista que acompanho há alguns anos e principalmente porque ele está no seu auge. Lie Down in the Light, oitavo disco de estúdio do cantor/compositor (e casualmente ator) Will Oldham sob o nome de Bonnie "Prince" Billy, é uma coleção de canções que esbanja critério em sua composição, além de mostrar um nível de escolhas estéticas e técnica que qualquer artista com 15 anos de estrada deveria ser capaz de atingir. You Want That Picture o traz num dueto com Ashley Webber, no qual os dois dão voz a um casal que troca quase-ofensas depois de uma dolorida separação, resgatando o momento em que tomaram consciência de que a dor que um causou ao outro seria aliviada quando morressem. Mesmo que talvez seja apenas para o ouvinte, a redenção vem durante os últimos minutos do disco, felizmente.



A produção de Lie Down in the Light ficou por conta de Mark Nevers, integrante do Lambchop, outros veteranos que soam como americanos tradicionais, unindo o country alternativo ao jazz e ao blues, e que esse ano vieram com um disco tão bom quanto tudo que costumam fazer, um pouco mais inclinado ao chamber pop.



Você obviamente já percebeu que o clima hoje é bem diferente do de ontem. E seguimos nessa linha, agora com mais um dueto extraído de um disco que nasceu da simples reunião de três músicos num intervalo entre seus afazeres, e que em sua totalidade de menos de meia hora, consegue tocar profundamente diversas vezes.



Finalizemos com uma banda que surpreendeu no ano passado com o ótimo Wild Mountain Nation, e que em 2008, apesar da terrível capa, fez a alegria de quem gosta de um bom country-rock. Black River Killer poderia facilmente ter sido escrita por Bob Dylan.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

"Vibe Disco" ou "Retrospectiva musical de 2008, segunda parte"


Vamos animar mais um pouco. Grande parte das melhores produções em música eletrônica do momento têm revelado um interesse na disco music dos anos 70 e 80, mas claro que nem tudo é relevante. O interessante é observar que as melhores produções acabam saindo de artistas que não se limitam ao suposto gênero, como o nosso primeiro exemplo. Lambs Anger certamente não estaria na minha lista (se eu conseguisse fazer listas) dos 20 melhores discos do ano, mas é justamente sua irregularidade e variedade que resultam numa senhora diversão.



Outra produção bastante irregular que garante, no mínimo, que você bata os pezinhos no chão é o debut da banda Golden Bug. O resultado aqui são momentos bastante distintos de climas, timbres e estilos. Em Hot Robot você ouvirá disco, funk, electro e house (e suas variações), em momentos alternados de sonoridades dançantes, obscuras e calmas.



E por falar em misturas, um dos lançamentos que passou muito tempo na minha playlist foi um simples EP de sobras de estúdio do The Juan MacLean. Apesar de abrangente (disco-punk e acid-house?!), a mistura aqui é bastante coesa, e já começo a especular sobre a qualidade do álbum que está por vir em 2009, se essas são apenas as sobras.



Outro lançamento modesto que acabou marcando muito foi o primeiro LP dos Glimmers, que teve distribuição gratuita nos lugares onde a dupla belga se apresentou. Em The Glimmers Are Gee Gee Fazzi a coesão também reina, apesar de covers inusitados para músicas de Olivia Newton-John e Chimo Bayo, e dos muitos convidados ilustres, como os produtores Lindstrøm e Prins Thomas e Stéphane Misseghers, baterista do dEUS.



Hercules & Love Affair não ilustra esse post à toa. O debut do projeto de Andy Butler foi um dos pontos altos de 2008, e já entrou para a história. A essa altura todos devem estar mais que acostumados com a épica Blind, então fico com uma faixa menos festejada, entretanto de qualidade equivalente.



Agora um pequeno choque. É claro que o Of Montreal não faz parte de nenhum movimento neo-qualquer coisa, mas como o intuito aqui é "vibe" e que danem-se os rótulos, falemos de Skeletal Lamping. Kevin Barnes e seus companheiros, não satisfeitos com a repercusão positiva unânime de Hissing Fauna, Are You the Destroyer?, de 2007, produziram uma pérola das grandes, que só faz sentido se ouvida do começo ao fim. Esqueçam as canções redondas e bem acabadas do ano passado e mergulhem numa confusão musical baseada nas (des)aventuras de um transexual negro e fã do Prince, de onde emergem esporadicamente alguns irresistíveis ganchos pop. Apesar da repercussão negativa na crítica, pra mim é um disco surpreendente e ao mesmo tempo natural. Estranhamente, considero que era o passo mais lógico a se esperar deles!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

"Para começar bem" ou "Retrospectiva musical de 2008, primeira parte"


Não foi um ano musicalmente ruim. De fato, o primeiro semestre nos reservou algumas surpresas a mais que o segundo, mas ainda assim tivemos muita coisa no mínimo relevante. Para um primeiro post, e para dar as boas vindas a quem parar por aqui, trago uma seleção "feel good".

A primeira música é a abertura do disco cuja capa ilustra (muito bem, por sinal) este post. Um disco disco de samples e loops bastante coloridos, de misturas étnicas e sonoras, que certamente não poderia ter um título melhor: Alegranza!



Agora me diga se você tinha uma sugestão melhor.
Foi o que suspeitei...

Seguindo a linha escolhida para a ocasião, agora teremos um cara que deixou de lado o techno experimental e entrou na onda neo-soul: Jamie Lidell. O álbum Jim é um deleite para os ouvidos, de produção e execução impecáveis, soando completamente sincero e natural. A faixa escolhida é de autoria do canadense Gonzales.



Agora, finalizando a pequena seleção, uma música tirada de um EP que mais parece um convite ao verão e às férias. No Way Down, do Air France, alia elementos baleáricos à feliz sonoridade do pop eletrônico contemporâneo sueco.



FAIXA BÔNUS: confira também essa versão que os Ruby Suns fizeram para a primeira música do post, e se gostar, vá correndo conseguir seu Sea Lion, de 2007.

domingo, 14 de dezembro de 2008